sábado, 3 de setembro de 2011

Artigo Científico: HABEAS CORPUS NAS PUNIÇÕES DISCIPLINARES


BREVES CONSIDERAÇÕES ACERCA DA CONCESSÃO DE HABEAS CORPUS NAS PUNIÇÕES DISCIPLINARES.

INGRID MENDONÇA OSSUOSKY, tem origem em família policial militar, natural de MANAUS/AM, graduada em Direito pela Universidade Paulista – UNIP, Pós-Graduanda em Direito Militar pela Universidade Cruzeiro do Sul, Brasília/DF; experiência profissional: Alzira Ewerton Advogados Associados (Área de atuação: Criminal, Cível, Trabalhista e Administrativo), Secretaria Municipal de Cultura – SEMC (Departamento de Controle Interno, Jurídico, Gabinete do Secretário e auxílio às atividades do Museu do Homem do Norte); Defensoria Pública da União – DPU (Setor Previdenciário), Ministério Público do Estado do Amazonas – MPE (Cível, Administrativo e Criminal - 25ª e 26ª Promotoria Militar), Municipal de Ordem Social de Planejamento Urbano – IMPLURB (Fiscal de Obras e Posturas - Licenciamento e fiscalização de atividades em estabelecimentos e logradouros e obras e edificações do Município de Manaus
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E-mail: ossuoskyadvogados@gmail.com


O instituto do habeas corpus é previsto constitucionalmente e dele encontramos referências em vários dispositivos constitucionais.
No artigo 5°, LXVIII, ele aparece da seguinte forma: “conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder”.
Os requisitos são, portanto, a ocorrência efetiva de violência ou coação, ou a ameaça iminente de sofrê-la.
A coação deve estar dirigida a pessoa certa, determinada. Aplica-se a qualquer pessoa, inclusive aos cidadãos militares.
No artigo 142, §2°, da Carta Magna encontramos a seguinte redação: “Não caberá habeas corpus em relação a punições disciplinares militares”. Tal vedação se aplica tanto às Forças Armadas, quanto às Forças Auxiliares (Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares).
Com a expressa vedação constitucional estaria o habeas corpus impossibilitado de ser concedido em sede de punições disciplinares militares?
A resposta é negativa, esta vedação não é absoluta, conforme será demonstrado a seguir.
Primeiramente, faz-se mister saber o conceito de transgressão disciplinar militar, uma vez que a punição se dá em cima desta figura.
Conforme ensina Jorge Luiz Nogueira de Abreu: “transgressão disciplinar é toda ação ou omissão que não constitua crime militar, ofensiva à ética, às obrigações ou aos deveres militares, ou ainda, que afete a honra pessoal, o pundonor militar, o decoro da classe, e, como tal, é classificada pelos regulamentos disciplinares das Forças Armada, Polícias Militares e Corpos de Bombeiros Militares”.
Importante salientar, que as transgressões disciplinares devem estar previstas em lei, ou seja, nos regulamentos disciplinares das instituições militares.
A não observância do militar aos regulamentos, gera para seu superior hierárquico o dever de puni-lo disciplinarmente, não podendo o militar se utilizar da figura do habeas corpus para elidir tal punição de acordo com o artigo 142, §2°, da Constituição Federal. Em tese tal afirmação é verdadeira, conforme será demonstrado a seguir.
Atualmente, existem três correntes quanto ao cabimento ou não do habeas corpus em sede de punições disciplinares.
A primeira corrente, não admite o remédio heróico. Para os seguidores desta corrente devem ser protegidos os conceitos de hierarquia e disciplina, acima de qualquer análise pelo Judiciário.
Seriam adeptos desta corrente Cretella Júnior, Walter Ceneviva e José Afonso da Silva.
Os referidos doutrinadores entendem que por razões ligadas aos conceitos de hierarquia e disciplina, não cabe o habeas corpus para as punições militares de caráter disciplinar. Onde há hierarquia, há, corretamente, uma relação de sujeição objetiva, que se traduz na disciplina. A disciplina é, assim, um corolário de toda a organização hierárquica. Essa relação fundamenta a aplicação de penalidades que ficam imunes ao habeas corpus, nos termos do artigo 142, §2°, da CF/88, que declara não caber aquele remédio constitucional em relação a punições disciplinares militares.
A segunda corrente, entende que a vedação da Constituição Federal se aplicaria somente quanto à análise do mérito do ato disciplinar, que é de natureza administrativa, não estando impedido o exame quanto à legalidade da punição a ser aplicada.
Compartilham desse entendimento Diomar Ackel Filho e Pinto Ferreira que entendem que o óbice ao habeas corpus há de ser admitido em termos, ou seja, o que se veda é a concessão deste remédio nos casos de punição disciplinar regular. Se a punição é imposta por autoridade manifestamente incompetente ou, de qualquer modo, ao arrepio das normas regulamentares que vinculam a ação do superior que pune, a ação heróica será certamente cabível.
A terceira corrente é extremamente liberal, permitindo o uso do habeas corpus em sede de transgressões disciplinares analisando-se não só os aspectos legais do ato, bem como o próprio mérito daquele ato administrativo essencialmente militar.
Filiamos-nos ao entendimento da segunda corrente, da mesma forma que o Supremo Tribunal Federal e os tribunais brasileiros.
Não se pode ter a primeira corrente como a mais correta, vedar a concessão do habeas corpus em qualquer hipótese de punição disciplinar seria um absurdo. Estaria se abrindo a possibilidade de autoridades incompetentes aplicarem punições disciplinares militares, ou então, autoridades competentes aplicarem punições disciplinares ao seu alvedrio, extrapolando os limites impostos pela lei ou em desacordo com esta. Mais descabido ainda é o entendimento da terceira corrente, que abre a possibilidade de se conceder habeas corpus para analisar tanto a legalidade do ato disciplinar, quanto o seu mérito.
Na profissão militar, a justiça é a pedra fundamental para promover disciplina, eficiência e moral nas Forças, com a finalidade de que a missão militar seja cumprida.
Quando o subordinado contrapõe-se ao seu superior, o efeito gerado no seio da tropa é muito forte e pode enfraquecer o Comando se este não puder exercitar os instrumentos de que dispõe, notadamente o Regulamento Disciplinar.
A punição disciplinar é o meio pelo qual o superior hierárquico reconduz à normalidade desejada a disciplina, quebrada pelo subordinado que serve a seu mando.
Pelo motivo acima exposto, se recomenda cautela na apreciação das punições disciplinares militares pelo Poder Judiciário.
Não se pode afastar os princípios constitucionais da inafastabilidade do Poder Judiciário, da legalidade, da dignidade da pessoa humana e do direito de ir e vir dos militares.
O judiciário, a nosso entender, pode e deve analisar a legalidade das punições disciplinares, uma vez que existem muitas ilegalidades quando da sua aplicação. Em muitos casos, o interesse pessoal é fator predominante na aplicação dessas punições. Deverá aferir somente alguns requisitos próprios do ato administrativo disciplinar, como a competência, a legalidade e as formalidades da medida.
Entretanto, não se deve adentrar ao mérito do ato administrativo, prerrogativa exclusiva dos Comandantes, Chefes e Diretores Militares, sob pena de estimular ou dar ensejo a intermináveis pendengas judiciais entre oficiais e subordinados, e com elas, a inexorável derrocada da hierarquia e disciplina.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABREU, Jorge Luiz Nogueira de. Direito Administrativo Militar. São Paulo: Editora Método, 2010.
ACKEL FILHO, Diomar. Writes Constitucionais. São Paulo: Editora Saraiva, 1991.
ASSIS, Jorge César de. Curso de direito disciplinar militar: da simples transgressão ao processo administrativo. 2ª Ed. Curitiba: Editora Juruá, 2011.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado, 1988.
BRASIL. Código penal militar, Código de processo penal militar, Estatuto dos militares, Legislação penal, processual penal e administrativa militar, Constituição federal. Organização dos textos, notas remissivas e índices por Alvaro Lazzarini. 10ª Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
CENEVIVA, Walter. Direito constitucional brasileiro. São Paulo: Editora Saraiva, 1989.
FERREIRA, Pinto. Curso de Direito Constitucional. 8ª Ed. São Paulo: Editora Saraiva, 1996.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 18ª Ed. São Paulo: Editora Atlas, 2005.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 9ª Ed. São Paulo: Editora Malheiros, 1994.

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